Chocolate com pimenta e a teoria dos opostos



          A medicina chinesa traz o Ying e o Yang como duas forças completamente opostas, antagônicas e interdependentes, de forma que, seria impossível obter qualquer tipo de significado ou identidade das duas metades quando as mesmas são analisadas isoladamente. O equilíbrio gerado pela soma das duas forças advém justamente do estado de moderação que é gerado quando as mesmas estão interligadas. Parece complicado, mas na verdade é só um jeito pomposo de dizer que sim, os opostos se atraem e se completam.

          Não é de se espantar que aquela sua amiga meiga e recatada depois de namorar 10 anos com o mesmo biotipo comportado e sem sal, tenha na verdade se casado com o personal mais assediado da academia. Ou aquele seu amigo garanhão, que nunca voltou sozinho pra casa e apostava todas as noites que pegaria o melhor par de pernas da balada, tenha de fato, caído de amores pelo kit erótico “rabo de cavalo + óculos de grau” da tímida colega de trabalho da mesa ao lado.

          Enquanto a grande maioria repudia e acredita que este tipo de relacionamento está fadado ao fracasso, os protagonistas destas histórias de amor provam que é sim possível uma convivência harmoniosa com as diferenças do parceiro, criando uma relação estável e duradoura. Uma combinação perfeita, que só é possível quando existem dois companheiros completamente envolvidos e inteiramente dispostos a degustar diariamente o sabor exótico de um namoro tão rico em sabores. Não existe nada mais desafiador do que namorar uma pessoa que é o extremo oposto de você. Seriam esses os chamados relacionamentos “chocolate com pimenta”, uma mistura inusitada e excitante que só os apreciadores de uma boa “culinária amorosa” são capazes de experimentar.

          Tudo que é demais cansa e se torna enfadonho. Romantismo em excesso mela e enjoa até os maiores amantes á moda antiga. Frieza demais distancia, zelo demais sufoca, espaço demais cria brechas para terceiros. Tudo que é demais deixa tedioso um status de relacionamento que deveria ser extremamente prazeroso. Nada melhor que uma dose diária de pimenta para abrir o paladar de quem ta acostumado com o cafe au lait de todo dia.

          Namoro bom mesmo é aquele que te desafia á ser o melhor que você pode ser. É aquele que exercita toda a sua paciência quando ele insiste em deixar jogado pela casa a meia suja de barro do futebol, ou que trabalha todo o comprometimento dele quando ele tenta dormir de conchinha com você naquela noite chuvosa mesmo detestando dividir a mesma cama com qualquer pessoa do universo. Até o frio precisa do quente pra criar aquele calorzinho gostoso. É porque ele adora uma balada que você saiu de casa naquela noite deprê e dançou o melhor house da sua vida, e é porque você é extremamente neurótica com organização que ele conseguiu achar aquele comprovante bancário que ele estava atrás há meses. Dar uma chance ao diferente, é dar, acima de tudo, uma chance á uma versão de você que talvez jamais existisse numa versão de relacionamento “convencional”.

          Claro que nem tudo se resume em flores. A pimenta tem hora pode amargar aquele cantinho da boca e despistar o gosto suave do chocolate, nada que não possa ser contornado com uma boa dose de água e um cinema com as amigas, para recuperar o eixo e começar tudo de novo. O importante mesmo é se deixar viver. É se permitir essa experiência tão transformadora e revigorante que é dividir sua vida, sua cama, seu espaço, seu lençol, com alguém que os próximos passos são um doce mistério á ser desvendado, e cujo talvez o único interesse que exista em comum seja o “nós”.

          Um brinde ao diferente, ao oposto, ao avesso. Um brinde ao equilíbrio e á harmonia dos opostos. Porque todo paraíso precisa de um pouco de caos.

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